Igreja colocou-se ao lado das vítimas? “Tenho as maiores dúvidas”, disse Pedro Strecht

LISBON (PORTUGAL)
Público [Lisbon, Portugal]

May 2, 2023

By Ana Dias Cordeiro

Comissão Independente para o estudo dos Abusos Sexuais na Igreja cessou em Fevereiro. Mas esta terça-feira esteve no Parlamento, a pedido do Chega, PS e PSD

O pedopsiquiatra Pedro Strecht, coordenador da comissão independente aos abusos sexuais de menores na Igreja, que terminou os seus trabalhos em Fevereiro com a divulgação do relatório final Dar Voz ao Silêncio, disse ter “as maiores dúvidas” que a Igreja se tenha colocado ao lado das vítimas.

A resposta dirigia-se a uma pergunta do líder parlamentar do Chega, Pedro Pinto, que entre várias questões, quis saber se a extinta Comissão Independente para o Estudos dos Abusos de Menores considerava que a Igreja se tinha colocado ao lado das vítimas no momento da divulgação do relatório final do estudo que incidiu sobre denúncias entre 1950 e 2022.

“Eu tenho as maiores dúvidas sobre isso”, disse Strecht na audição na comissão parlamentar dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, nesta terça-feira, acrescentando que, por parte da Igreja, “a reacção foi evolutiva mas muito ambivalente”.

Disse ainda que a reacção “beneficiou do efeito de grupo” tendo os bispos entendido que se “não participassem quando outros estavam a participar seria de difícil compreensão por parte do público em geral”, numa referência a resistências por parte de alguns sectores em cooperar com os trabalhos da comissão.

O pedopsiquiatra repetiu que a reacção às conclusões do estudo “foi evolutiva e ambivalente” e isso mesmo o surpreendeu porque foi “como se, para alguns, o estudo não tivesse sido resultado de um pedido da Conferência Episcopal Portuguesa”.

Pedro Strecht, bem como Ana Nunes de Almeida e Álvaro Laborinho Lúcio, na qualidade de membros da comissão, deram respostas a perguntas dos deputados de vários partidos na audição desta terça-feira por primeiro requerimento do Chega, ao qual se juntaram o PS e o PSD, seguindo-se as audições do cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, e do presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, bispo José Ornelas, a pedido do Chega e do PS, todas a propósito das conclusões do relatório final e das suas recomendações.

“Segredo da confissão não vai mudar”

Laborinho Lúcio admitiu que os abusos sexuais de crianças eram um problema transversal à sociedade, ao mesmo tempo que advertiu: “Não podemos alinhar com esse discurso”. E explicou que o facto de este ser um problema transversal a outros sectores “não impede que se trabalhe com seriedade a questão da Igreja porque foi ela que esteve em estudo”.

Em resposta a vários deputados sobre a necessidade da quebra do sigilo da confissão, o juiz conselheiro declarou “claro que sim” que era uma necessidade, embora tenha apontado para “os obstáculos enormes do ponto de vista do direito canónico e através da própria Concordata”.

“O segredo da confissão não vai mudar, não é o mesmo que o segredo profissional”, disse mais tarde D. José Ornelas. Sobre a ocultação, justificou que era “preciso ver antes de lhe chamar ocultação”, justificando que um responsável da Igreja quando não deu conhecimento de uma determinada situação não foi por isso, mas “porque não tinha conhecimento das coisas”.

Expectativas centradas no Grupo VITA

Em várias outras questões sobre os apoios às vítimas, o bispo José Ornelas colocou a grande parte da expectativa na concretização das respostas da Igreja às recomendações da comissão nos trabalhos do Grupo VITA, o novo grupo de acompanhamento das situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica, liderado pela psicóloga forense Rute Agulhas.

The independent commission, which ceased to function on February 13, validated 512  testimonies  received (out of a total of 564),  which led it to point out , in its conclusions, a minimum number of 4815 victims.

https://www.publico.pt/2023/05/02/sociedade/noticia/igreja-colocouse-lado-vitimas-maiores-duvidas-pedro-strecht-2048227